quinta-feira, 30 de setembro de 2010

DOS FILHOS DESTE SOLO

Maria Aglais de Oliveira é anistiada.

MARIA AGLAIS DE OLIVEIRA (Maria Dora, na clandestinidade) é anistiada.
Ela nasceu em Jaguaruana, no estado do Ceará, em 1933.
Aos seis anos de idade perdeu a mãe, que morreu de febre amarela. Seu pai, também contaminado pela febre amarela, dividiu os vinte filhos entre parentes e amigos.

Por Márcia Viotto*

Ela nasceu em Jaguaruana (localidade de Pitombeira), no estado do Ceará, em 1933. Aos seis anos de idade perdeu a mãe, que morreu de febre amarela. Seu pai, também contaminado pela febre amarela, dividiu os vinte filhos entre parentes e amigos. Maria foi parar na cidade de Russas, sendo criada pela sra.Rufina Pereira - viúva, amiga dos seus pais.

Rufina, de origem latifundiária, era muito severa e Maria Aglais, aos sete anos passou a ser a empregada da casa. Ela matriculou Maria Aglais na escola publica até 4º ano primário e depois em uma escola particular administrada pelas freiras. Maria, inteligente e esperta, aproveitou a oportunidade, já tinha uma compreensão da importância de estudar, percebia que era a sua chance de sair daquela situação.

Aos dezoito anos perde sua “mãe” adotiva. Como não tinha herança, as freiras, a convidaram para morar com elas no orfanato. Uma prima chamada Francisquinha, que tinha amizade com o prefeito, conseguiu duas bolsas uma para fazer o curso normal e outra para fazer contabilidade, mas ela acabou fazendo apenas o magistério.

Maria Aglais tinha uma irmã Giselda , que morava em Recife e resolveu nas férias ir até lá visitá-la. Conheceu Maria Gonçalves assistente social que desenvolvida um trabalho na Associação Nordestina de Credito e Assistência Social .Aprovada no treinamento foi trabalhar na zona rural de Pernambuco – em Bom Conselho e Garanhuns.Logo foi promovida a supervisora das equipes, o que lhe permitiu viajar, ao Porto Rico (1963) e depois aos EUA –Nova York, Washington , fazer cursos de atualização e visitar a zona rural .Foi quando se deu conta da pobreza em que vivia o Brasil - o seu nordeste. Não conseguindo conciliar seus estudos com o trabalho pediu demissão e foi procurar a faculdade federal de Pernambuco – passando no vestibular para ciências sociais. Logo depois conseguiu empregar-se na sucursal do Jornal do Brasil como secretaria. Neste período, Miguel Arraes, liderança expressiva foi preso. Começou a tomar contato com militantes da Ação Popular foi participar com elas do movimento estudantil. Os centros acadêmicos foram postos na clandestinidade. Maria foi demitida do Jornal do Brasil.

Então uma assistente social- Judite da Mata Ribeiro- ligada a Igreja que trabalhava na SUDENE conseguiu para Maria participação de um projeto de formação de camponeses para a reforma agrária. Depois Maria Aglais foi indicada como técnica de cooperativa pesqueira na cidade de Ilhéus –BA. Foi ali que se deu conta da divisão de classes. No meio dos pescadores, percebeu a imensa desigualdade daqueles que viviam do dia a dia para comer. A idéia era criar uma cooperativa. Foi então que conheceu o PC DO B – através do dirigente “Gordo” e abraçou o ideário comunista. A partir de 1969 passou a viver na clandestinidade, de fazenda em fazenda de cacau, com o objetivo de conversar com trabalhadores e levar as idéias revolucionarias. Convivia com o pessoal da AP que vendia coisas na feira de Camacã. Foi quando conhece seu futuro marido- Zé. Maria passou a alfabetizar os trabalhadores e começou a ser mais observada. Teve um aborto e depois perdeu um filho recém nascido em acidente.

A situação dos trabalhadores era terrível. Comiam farinha e pimenta. Fugindo em busca de trabalho o casal morou em casa de chão batido e cama de palha. Maria adoeceu. Teve outro aborto.

Foram então para a casa dos pais do Zé – em Itabuna, e trabalhavam com venda de comida na feira.

Em 1973, a direção do PC DO B fez uma reunião e comunicou que a situação estava grave e que o Partido não tinha condições de manter o contato. A família de seu marido havia mudado para SP, então o casal resolveu vir também. Foram morar em um porão na casa de uma irmã de Zé, em S.Miguel Paulista .Maria foi ser cobradora de ônibus, enfrentando várias madrugadas. Engravidou de novo e o medico a aconselhou a não mais trabalhar para poder levar a gravidez a termo. Após o nascimento de sua filha foi trabalhar na fabrica de latas Matarazzo, mas não agüentou. Passou a trabalhar em casa com confecção de costura e ganhava por produção,também trabalhou no hospital da Penha como auxiliar de enfermagem.
Neste momento, seu marido, que trabalhava em uma metalúrgica reencontrou o pessoal do PC DO B na pessoa de Lucia e Creuza. A partir daí retomou a luta, através do movimento contra a carestia, com nossos queridos camaradas Tom (já falecido) e Ana Martins (nossa atual dirigente estadual).Ana trabalhava no Mobral e Maria passou a trabalhar também.Entrou na luta pela moradia e todos os movimentos,o principal deles o movimento contra a carestia. Maria Aglais passou a fazer parte do Zonal da Leste do PC do B.

Daí por diante, a luta pela anistia, pela Amazônia é nossa ,etc.Veio a anistia e Maria Aglais que então era Maria Dora foi retomar sua identidade no Recife (1981) e Ceará onde trabalhou na Coelce (empresa de eletricidade) foi buscar seus documentos, seu tempo de serviço na cooperativa(sem registro).

Com a anistia, o PC do B voltou a legalidade e Maria Aglais passou a atuação na direção do Distrital da Mooca e depois presidente no distrital de Sapopemba-Vila Prudente.
No movimento dos monitores do Mobral se ligou a APEOESP. E a partir daí Maria Aglais começou a participar da vida sindical do movimento dos professores dando aula na escola estadual Caetano de Campos.

O PC DO B participou de uma invasão habitacional na cidade A.E.Carvalho e Maria resolveu entrar junto com 95 famílias. Já separada, com uma filha pequena de 3 anos, nada tinha a perder.

Não tardou ação de despejo do governador biônico Maluf, ficando três dias ao relento negociando um lugar para morar.

As famílias foram alojadas num conjunto habitacional, ainda em construção, que depois foi inaugurado pelo então prefeito Mario Covas do então MDB, em Sapopemba, conjunto Teotônio Vilela, sem água, sem luz, sem escola, sem creche, sem infra-estrutura nenhuma. Maria Aglais foi uma das principais lideranças a organizar e integrar o conjunto (promorar e prédios) criando a associação dos moradores, que passou a reivindicar o funcionamento dos serviços sociais (escolas, creches, luz, água,esgoto,etc) .

Professora da rede estadual e concursada da prefeitura, ministrando aula para o ensino fundamental jovens e adultos, acumulava três cargos. Participava como conselheira da APEOESP e em seguida passou a acumular dois cargos na Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, passando atuar no SINPEEM.

Aposentou-se aos 70 anos de idade na escola publica, por não ter como provar, seu tempo de serviço prestado em função do período de clandestinidade e em 2005 entrou com o processo de anistia, tendo conseguido sua aprovação em setembro de 2009.

Maria Aglais, um ícone do PC do B, pela sua militância aguerrida, fiel, possuidora de uma grande humanidade, exemplo e estimulo a todas que lutam, tem dedicado sua vida a causa do socialismo, não desiste de sonhar que outro mundo é possível. Atualmente milita no Distrital de S. Miguel, junto à terceira idade daquela comunidade e é também membro da diretoria da União Brasileira de Mulheres.

Parabéns e obrigado por você existir em nossas vidas!

Por Márcia Viotto - socióloga, professora, atualmente assessora da CTB- militante do PCdoB -V.Prudente .

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